quinta-feira, 12 de junho de 2008

Para Ler

Bandy, WD & Sanders, B. Exercício Terapêutico: técnicas para intervenção. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003.
Cherng, WJ. Iniciação ao Taoísmo. vol. 1. Rio de Janeiro: Mauad, 2000.
Coelho Filho, HF. Exercícios Chineses para Saúde. Niterói: Tao Te Tang. Monografia para o grau de Monitor, 2001.
Da Liu. Tai Chi Chuan e Meditação. São Paulo: Pensamento, 1989.
Davis, CM. Fisioterapia e Reabilitação: terapias complementares. 2. ed. Rio de Janeiro: LAB, 2006.
Dethlefsen, T. & Dahlke, R. A Doença como Caminho. São Paulo: Cultrix, 1995.
Ding, L. O Chi Kung Meridiano. São Paulo: Ícone, 1996.
Eckert, A. O Tao da Cura: a teoria dos 5 elementos aplicada ao Qi Gong, Tai Chi, Acupuntura e Feng Shui. São Paulo: Ground, 2002.
Goleman, D. A Mente Meditativa. São Paulo: Ática, 1997.
Hon, SC. Qigong Taoísta para Saúde e Vitalidade. São Paulo: Pensamento, 2005.
Huang Ti. Nei Ching: o livro de ouro da medicina chinesa. Rio de Janeiro: Objetiva, s/d.
Huang, Al C. Expansão e Recolhimento: a essência do Tai Chi. São Paulo: Summus, 1979
Karagulla, S. & Kunz DG. Os Chakras e os Campos Energéticos. São Paulo: Pensamento, 1992.
Laplanche, J. Vocabulário da Psicanálise/Laplanche e Pontalis. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
MacRitchie, J. Chi Kung: mais energia. Lisboa: Editorial Estampa, 1994.
Miller, RM. & Harper, JM. Manual Prático da Energia Psíquica. São Paulo: Siciliano, 1989.
Ming, ZY. Liang Gong Shi Ba Fa: ginástica terapêutica e preventiva. São Paulo: Pensamento, 2002.
Sohn, RC. O Tao e o Tai Chi Kung. São Paulo: Pensamento, 1992.

domingo, 8 de junho de 2008

Taijiquan (EQiValências)

T'ai Chi Ch'uan (Equivalências)
Raymundo P. Arruda


RESUMO
A arte marcial do T’ai Chi vem sendo praticada na China desde o séc. XVI também como forma de curar e prevenir doenças, tendo se difundido largamente após 1956 com o advento da chamada "Forma de Pequim". Prescrita como parte dos cuidados de pacientes, provou-se eficaz no tratamento de doenças crônicas... Seu êxito está relacionado com a profunda concentração que exige, bem como com a lentidão dos movimentos coordenados com a respiração. Ao treinar simultaneamente mente e corpo, estimula ativamente o córtex cerebral, liberando-o de alterações patológicas e auxiliando a curar determinadas perturbações mentais. Embora o T'ai Chi Ch'uan venha se constituindo em desporto e, como tal, se voltando para o alto rendimento, nossa ênfase será posta nos seus objetivos tradicionais, quais sejam, Autoconhecimento, Paz, Saúde e Longevidade!

Taoismo
A filosofia chinesa é essencialmente prática, sua compreensão intelectual sendo inútil se não vivenciada no dia-a-dia. O TAO é o centro dessa práxis filosófica e espiritual, e significa, a um só tempo, o Caminho, o ato de caminhar e o caminhante (2). O Taoísmo ocupa-se sobretudo da vivência desse Caminho universal, segundo a ordem e o curso da Natureza. Desde tempos imemoriais, os chineses já conheciam o T’ai Chi, a unidade suprema que preside a união do Yin e do Yang, as energias opostas mas complementares que integram, condicionam e estimulam tudo que existe no Universo manifestado. Yin é o princípio obscuro, centrípeto, receptivo, denso; relaciona-se com o corpo, a Terra, a Mãe. Yang é o princípio luminoso, centrífugo, criativo, expansivo; refere-se ao espírito, ao Céu, ao Pai. Yin e Yang estão em eterna mutação, sendo como as duas faces de uma mesma moeda, um contendo e determinando o outro. Do equilíbrio entre eles nasce o bem, do desequilíbrio surge o mal (1). “Quando Yin e Yang se separam, a força da vida se esvai; o Sopro se extingue”(5).

A Origem Lendária
Numa tarde de Primavera, na distante dinastia Song, o alquimista taoísta Chang San-feng, versado nos ramos do saber antigo, meditava em sua casa, no Monte Wu Tang, quando viu da janela um grou descer de uma árvore para atacar uma serpente. Seguiu-se um duelo feroz: a ave avançava com o bico afiado, a cobra se esquivava e preparava o bote; o grou abria uma das asas para proteger o pescoço da investida da serpente e tentava cravar-lhe as fortes garras, mas logo recuava para fugir de uma picada. A serpente combatia com agilidade e flexibilidade, com deslocamentos curvilíneos. Exausta, a ave retirou-se (3). O Imortal viu no fato a supremacia da astúcia sobre a força, da flexibilidade sobre a rigidez; a importância da alternância do Yin e do Yang, e criou o T’ai Chi Ch’uan: arte marcial e caminho para a paz, saúde e longevidade. Essa arte chinesa do movimento é uma disciplina que visa sobretudo o cultivo da energia interior, a manutenção do Eixo e a harmonização das polaridades. Seus movimentos espiralados, coordenados com a respiração e executados com lentidão e suavidade, dirigidos por uma mente concentrada e receptiva, permitem a conservação da energia vital, a liberação das tensões; relaxam e promovem a saúde física, mental e espiritual, segundo o curso da Natureza.

Qualidade de Vida
O homem moderno começa finalmente a perceber que as causas dos males que o afligem só podem ser enfrentadas através da reeducação, da modificação dos hábitos e postura perante a existência, retornando a uma vida simples e natural em que as conquistas materiais não se dêem à custa de seu patrimônio espiritual. A prática das Artes Taoístas, como Tai Ji Quan, Qi Gong e Meditação do Silêncio, enseja o retorno à Unidade, ao Princípio, à Harmonia contida na potencialidade primordial. Elas propiciam a restauração do Eixo, mantendo-nos em sintonia com os processos naturais do nosso corpo, mente e espírito e com o ambiente que nos cerca (1). “É necessário encontrar a paz interior que lhe permitirá agir de acordo com o tempo. Os resultados desta ação com certeza lhe serão benéficos.” (Dito popular chinês)

Fundamentação Teórica
O milenar T’ai Chi Ch’uan surgiu na China, na Dinastia Song do Sul (1127-1279), como uma arte marcial interna (enfatizando o uso da energia antes da força muscular, o autoconhecimento, a estratégia e a vontade), contudo, tornou-se mais conhecido pelo seu caráter terapêutico, sendo hoje reconhecido e buscado em todo o mundo como fonte de saúde, longevidade e bem-estar. Seus movimentos espiralados e suaves decorrem da percepção da Natureza: da fluidez da água, da amplitude do céu, da segurança e fertilidade da terra, da constante movimentação dos animais, da contínua alternância das estações, da importância da integração e harmonia. Tudo isso aliado aos conhecimentos da milenar Medicina Taoísta.

O Qi
Sem inércia nem peso, o Qi, ou energia vital, integra tudo que existe e é absorvido por todo o organismo, sendo responsável pela contração e expansão do Universo. TUDO É QI! Segundo a Medicina Chinesa (5), além dos vasos sangüíneos e linfáticos, existe no corpo um complexo sistema de vasos e canais energéticos (meridianos) por onde circula o Qi. Quando se realizam movimentos conscientes de forma contínua e circular, unidos com a respiração, está-se não só exercitando o corpo físico, mas também o corpo energético. Qi Gong (uma das mais antigas práticas de saúde conhecidas – reconhecido pela OMS) é a arte de cultivar a energia e constitui a base da medicina, das artes marciais e do desenvolvimento espiritual do Extremo Oriente. Os bloqueios energéticos produzem doenças e, se não são desfeitos, podem transformar-se em desordens musculoesqueléticas, tumores ou, na melhor das hipóteses, gerar mal-estares e distúrbios causados pelo hiperfuncionamento de determinados órgãos ou vísceras para compensar o hipofuncionamento de outros. Pesquisas científicas (6) vêm demonstrando os benefícios do T’ai Chi Ch’uan para o sistema circulatório: o relaxamento proporcionado pelos exercícios dilata os vasos sangüíneos, diminuindo a pressão arterial. Os pulmões também são beneficiados pela respiração profunda e completa que utiliza toda sua capacidade e diminui a necessidade de captação de oxigênio pelo organismo. Fígado e rins também são beneficiados, bem como os demais órgãos internos, pois a respiração abdominal massageia toda a cavidade abdominal. Como os exercícios são praticados em pé, em “bases” nas quais os joelhos estão levemente fletidos, as pernas são fortalecidas, principalmente os músculos quadríceps, o que poupará os joelhos e a coluna vertebral, em conseqüência do encaixe da pelve necessário para o alinhamento da espinha.

A Respiração
A respiração superficial e irregular produz inúmeros distúrbios físicos, emocionais e energéticos. A respiração natural, calma e consciente proporciona uma mente calma e concentrada, essencial à prática do T’ai Chi Ch’uan: as energias circulam sem bloqueios, o sangue flui sem impedimentos, os músculos se relaxam, os órgãos internos são irrigados, as células são nutridas.

A Mente
A mente do praticante de T’ai Chi Ch’uan é serena; atenta sem ser tensa; fixa sem ser obsessiva; relaxada sem ser distraída. “A mente conduz o Qi, a energia conduz o Xue e o sangue rege os movimentos”, ensinam os mestres. Portanto, onde colocamos nossa atenção colocamos nossa energia. A Medicina hoje conclui que quase todas as doenças são psicossomáticas, tendo-se criado inclusive uma especialização para estudar a interação da mente com a secreção hormonal, o sistema imunológico e sintomas físicos: a neuropsicoendocrinoimunologia (!). No Oriente, isso já é sabido e aceito há milhares de anos, por isso pratica-se a Meditação como método preventivo de doenças, por trazer paz interior e acalmar a mente, sendo um grande aliado contra o estresse emocional (4), por diminuir a atividade do sistema nervoso simpático e, conseqüentemente, a liberação de hormônios a ele ligados, como a adrenalina, além de estimular a liberação de endorfinas, que causam prazer e bem-estar. O T’ai Chi Ch’uan é às vezes chamado de “Meditação em movimento” ou de “Seqüência de Qi Gong”.

Princípios Básicos do T’ai Chi Ch’uan
Existem diversas escolas de T’ai Chi Ch’uan, desenvolvidas a partir dos estilos clássicos Yang, Chen, Wu, Sun, mas os princípios básicos são os mesmos em todos eles, e sua prática dedicada fará com que se solidifiquem (3).

“E-Qi-Valências” (Qualidades Físicas e Energéticas)
Tranqüilidade e concentração: estados mentais a serem buscados.
Fluidez: respiração sem esforço; movimentos harmoniosos.
Suavidade: movimentos regulares, arredondados, ritmados.
Equilíbrio: boa base; encontrar o eixo físico, psicológico e energético.
Centralização: corpo ereto. “Pés enraizados no chão e cabeça tocando o céu.”
Relaxado, mas firme: flexibilidade e descontração, força e resistência.
Coordenação: corpo, mente, respiração e energia coordenados; mãos e pés movem-se em harmonia com os braços e pernas, cinturas escapular e pélvica, a cabeça e o olhar.
Continuidade: “a forma assemelha-se a um rio que flui livre e pacificamente”.

Conclusão
Estudos científicos recentes (6-9) confirmam o que a tradição atesta há centenas de anos: a prática do antigo Tai Chi Chuan tem efeito positivo sobre as variáveis de aptidão física, sendo uma boa sugestão de atividade para a manutenção da capacidade funcional e melhora da saúde integral e qualidade de vida de indivíduos de todas as idades. A Educação Física se enriqueceria se reconhecêssemos as EQUIVALÊNCIAS das visões ocidentais e orientais do movimento humano. Sistemas como o do T’ai Chi Ch’uan nos permitem entrar em contato com a sempre atual visão da cultura chinesa clássica, cuja sabedoria se faz tão oportuna quanto eficaz nestes tempos de desequilíbrio e excessos, pois nos ajuda a recuperar a naturalidade do corpo e do movimento.

*Trabalho apresentado por Mestre Hay no III SEMINÁRIO UNIVERSO DA EDUCAÇÃO FÍSICA. Niterói, Universidace Salgado de Oliveira, 2004.


Referências Bibliográficas
1. ARRUDA RP. http://www.taotetang.org.br/artes_marciais. 2004.
2. CHENG WJ. Tai Chi Chuan – a alquimia do movimento. 4. ed. Rio de Janeiro, Mauad, 1989.
3. DESPEUX C. Princípios básicos da prática do Taiji Quan. In: Tai Chi Chuan – arte marcial, técnica da longa vida. São Paulo, Pensamento, 1981. p. 121-35.
4. GOLEMAN D. A Mente Meditativa. 3. ed. São Paulo, Ática, 1997.
5. HUANG TI. Nei Ching – o livro de ouro da medicina chinesa. Rio de Janeiro, Objetiva. s/d.
6. LAN C, CHEN SY, LAI JS, WONG MK. The effect of Tai Chi Chuan on cardiorespiratory function in patients with coronary artery bypass surgery. Med. Sci. Sports. Exerc. 31: 634-8, 1999.
7. OLIVEIRA RF, ANDRADE DR, ARAÚJO TL. Comparação da flexibilidade entre praticantes de Tai Chi Chuan e não praticantes de atividade física. Anais do XIX Simpósio Internacional de Ciências do Esporte, 83, 1994.
8. OLIVEIRA, RF, MATSUDO, SM, ANDRADE DR, MATSUDO VKR. Efeitos do treinamento de Tai Chi Chuan na aptidão física de mulheres adultas e sedentárias. Rev. Bras. Ciên. Mov. 9 (3):15-22, 2001.
9. YAN J H, DOWNING J H. Tai Chi: an alternative exercise form for senior. Journal of Aging and Physical Activity 6: 350-362, 1998.

domingo, 23 de dezembro de 2007

O Bem e o Mal

Luciano Villanova*

Preparei o texto abaixo para divulgar, como mensagem de final de ano,alguns conceitos importantes da Tradição Taoísta. Procurei ser o mais claro e sucinto possível. Porém, tenho consciência, que a parte inicial do texto, principalmente numa primeira leitura, será de difícil entendimento. No entanto, acredito que vale o investimento de gastar alguns minutos numa leitura atenta. Escolhi o tema sobre a origem do bem e do mal em virtude do momento que a nossa civilização atravessa, onde o mal parece predominar muitas vezes sobre o bem. Espero que este conhecimento milenar possa ajudar-nos a entender melhor o momento que vivemos e a nossa parcela de culpa e/ou contribuição em relação ao todo. Um grande abraço,
Luciano.

Segundo a Tradição Taoísta, toda a Existência, do macrocosmo ao microcosmo, dos seres humanos a qualquer outra espécie de seres, ou de coisas, todos nascem de uma mesma fonte única chamada de Absoluto ou "Dào". Por este motivo, antes de explicarmos a origem do bem e do mal, precisamos compreender o significado do termo Absoluto, ou seja, precisamos compreender o que o Taoísmo chama de "Dào".
O ideograma "Dào" significa em Chinês "Caminho" ou "Via". Um caminho especial, pois tanto numa análise mais profunda do ideograma chinês "Dào" como através dos próprios textos taoístas, podemos entender que o "Caminho" só existe quando existe um caminhante e quando existe também um ato de caminhar, simultâneos e inseparáveis. Sendo o maior caminho o próprio Universo, o maior caminhar a própria Existência, e o maior caminhante Aquele que gera o Universo ao caminhar, podemos dizer que o "Dào" é ao mesmo tempo o Criador, a Criação e o Ato de Criar. Como Criador, o "Dào" é o Vazio. Não o vazio que coincide com o nada, mas o Vazio que abrange tudo o que existe, que abrange toda a Forma, e a Não-Forma também. Como Criação, o "Dào" é a Existência que existe no Vazio. Como Ato de Criar é a relação entre Vazio e Existência e a transformação que une os dois. Assim é que o "Dào", o Absoluto, é a totalidade que inclui o visível e o invisível, o ser e o não-ser juntos. Por isso, o "Dào" não se limita a nome, forma, sentido, imagem, ou qualquer outra coisa. No entanto, todas as coisas são partes do "Dào" e são formas do "Dào" se expressar.

O Absoluto indivisível, uma vez observado a partir da nossa mente, apresenta dois estados: o Estado Latente e o Estado Manifestado. O "Dào" em estado latente é como um Silêncio, ou Vazio, que permite a manifestação de todas as coisas. O "Dào" em estado manifestado é como o Som, ou a Existência, que se manifesta dentro do Silêncio e do Vazio. A "soma" do Estado Latente com o Estado Manifestado, é o próprio Absoluto, é o próprio "Dào".
No "Dào" em estado latente não há bem nem mal. Este estado é uma condição de total transparência, onde não há pensamento, não há imagem, não há linguagem, não há nenhuma expressão do ego, pois, de fato, não há ego.
No "Dào" em estado manifestado surgem o que chamamos de Dois Princípios e Três Poderes, os quais propiciam o aparecimento do bem e do mal no Universo. Os Dois Princípios correspondem ao Yang e ao Yin. Estes termos significam literalmente Luz (ou Luminosidade) e Sombra (ou Obscuridade). Eles não só estão presentes em todas as coisas, como são a própria base de tudo que existe (todos os seres, planetas, energias, pensamentos, etc.).

O princípio Yang compõe o lado firme, leve, tênue, expansivo, criativo, luminoso, espiritual, de tudo o que existe. Representa por analogia o céu, o sol, o dia, o verão, o pai, a luz, o quente, o alto, o homem, o espírito, a expansão, a continuidade, a firmeza, etc.

O princípio Yin compõe o lado flexível, pesado, denso, contraído, receptivo, obscuro, material, de tudo o que existe. Representa por analogia a terra, a lua, a noite, o inverno, a mãe, a sombra, o frio, o baixo, a mulher, o corpo, a contração, a descontinuidade, a flexibilidade, etc.

Apesar de numa primeira leitura podermos ser levados a entender que estes dois princípios representam características de opostos antagônicos, e que o bem se confundiria com o princípio Yang (luminoso, espiritual e contínuo) e o mal seria o próprio princípio Yin (obscuro, material, descontínuo), na verdade estes dois princípios não são opostos antagônicos, mas sim opostos complementares. São como dois lados de uma mesma moeda, como dois pólos de um mesmo imã, ou duas faces de um mesmo "Uni-Verso". Sendo assim, infinitamente e eternamente inseparáveis. Um dependendo do outro para existir, da mesma maneira que a sombra (yin) não existe sem a luz (yang) e a luz não é visível sem a sombra. Da mesma maneira que o alto só existe comparado ao baixo e o quente comparado ao frio e vice-versa. Como o dia e a noite, os dois princípios vivem também em eterna alternância, um sempre se seguindo ao outro. Então, os princípios Yang e Yin isoladamente não são o bem e o mal. Eles surgem no Universo simultaneamente e em perfeito equilíbrio, equilíbrio este que jamais seria perturbado se não fosse o aparecimento dos Três Poderes: o poder do Céu, o poder do Homem e o poder da Terra. O Céu e a Terra usam o seu poder sem intenção, com naturalidade. É exatamente o Homem, que por viver em um estado instável de consciência, acaba gerando a desarmonia entre os Dois Princípios, ao fazer uso do seu poder de forma egóica, intencional, julgadora e separatista.

Na história da humanidade são bem conhecidas as atuações dos seres humanos que às vezes modificam a natureza de uma forma nem sempre equilibrada e harmoniosa. Toda atuação humana, mesmo a nível apenas mental, consciente ou não, se reflete diretamente no equilíbrio entre os princípios Yang e Yin, entre o Céu e a Terra. Através de uma consciência que pode passear entre os estados mais elevados e os mais inferiores possíveis, a atuação do homem no Universo deixa de ter a inocência do Céu e da Terra e passa a ter intenção. Por isso, interfere na inter-relação dos Dois Princípios.

Sempre que o homem atuar harmonizando e equilibrando os dois opostos complementares, sempre que atuar na direção de manter ou propiciar o equilíbrio entre Yang e Yin, nós teremos o bem. Por outro lado, sempre que a atuação do homem não estiver de acordo com a harmonia e o equilíbrio original dos Dois Princípios, nós teremos o mal. Em termos práticos, toda vez que agirmos de forma intencional, toda vez que agirmos julgando e separando as manifestações, ou nos julgando separados do Universo, estaremos provocando o desequilíbrio entre os Dois Princípios, e estaremos assim fazendo um mal para todo o Universo, incluindo nós mesmos. O próprio fato da consciência humana, no nível de mente, enxergar o Universo de forma fragmentada, já é em um nível mais sutil um mal intrínseco.

Finalmente, o bem é a Grande Harmonia que depende do nível de consciência com o qual vemos o Universo e a partir do qual agimos. Sua busca não é uma utopia inatingível ou somente alcançável após abandonarmos o mundo manifestado. Essa perfeita harmonia pode ser atingida por uma pessoa viva, pois o próprio Estado Latente onde ela existe transpassa toda a "realidade" do Estado Manifestado. Para isso, basta que cada ser atue buscando manter sua consciência no Estado Latente (estado original). Isto não é simples, nem fácil, pois há muito desaprendemos como agir apenas pela nossa verdadeira naturalidade – não dualista, não intencional, não julgadora – e muito parecida com o que tínhamos ao nascer.

Todo o trabalho da Tradição Taoísta está sempre focado para que os seres voltem a viver o que chamamos Ação Não-Intencional. Para que os seres retornem a sua naturalidade original, sem dividir o Universo. Esta naturalidade está no "Dào", no Céu, na Terra e está também, ainda que esquecida e adormecida, no Homem. É a natureza real e primordial de cada ser. Resgatando e vivendo este estado de consciência pura, não intencional, o homem encontrará a harmonia em relação a sua própria espécie, em relação a todos os seres do Universo e em relação ao próprio Universo em si. E sempre que isto ocorrer teremos o Grande Equilíbrio, o Grande Bem.



*Luciano Villanova é sacerdote taoísta